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O Aumento de Jogos Gacha em Gaming

  • Foto do escritor: Lúcia Pires
    Lúcia Pires
  • há 4 dias
  • 12 min de leitura

Texto, Edição e Ilustração: Lúcia Pires


O que é Gacha?


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Tem havido um aumento de um certo tipo de jogo no mundo dos videojogos. Em quase todos os gameshows de jogos recentes dos últimos 5 anos, certamente já viste jogos que são anunciados como free to play, mas não da forma que imaginas. A principal forma de monetização desses jogos não é através de um battlepass ou bundles. Já deves ter ouvido falar do termo gacha ou já te deves ter deparado com algo que tem mecânicas de gacha. Se não, o termo gacha vem da palavra japonesa “gachapon”, o som que vem daquelas máquinas de venda de bolas com brindes, que distribuem pequenos brinquedos em cápsulas. Gacha em si é dar um prémio aleatório de uma lista de prémios potenciais. Esses itens podem variar entre ter a mesma chance de aparecer ou ter diferentes probabilidades de aparecimento ou raridades.


A maioria das pessoas no mundo de gaming veria esta descrição e pensaria que estou a falar de loot boxes, e estariam corretas. Antes da regulamentação/eliminação geral das loot boxes de live service games, elas eram a principal forma de obter cosméticos nos jogos. Tu recebias uma caixa e, dependendo da tua sorte, ganhavas uma skin para um personagem/arma. No entanto nos jogos gacha, estás a tentar obter personagens. As mesmas personagens que terias desbloqueado através de missões e/ou história são bloqueadas pelo o que os jogos gacha chamam de “character banners”.


É de alguma forma DIFERENTE DE gambling?


Sim e não. Embora os jogos gacha apresentem oportunidades/riscos, eles têm sistemas que protegem o jogador contra perdas, ao contrário dos jogos de azar na vida real. Não é só possível jogar esses jogos de forma totalmente gratuita, como também é possível obter os mesmos itens de alguém que gasta dinheiro, ganhando o que se chama in-game currency e sem gastar um único cêntimo de dinheiro verdadeiro. No entanto, nem sempre foi assim.


Houve um caso em 2016 acerca de um evento de ano novo no jogo Gran Blue Fantasy, em que várias pessoas no Japão gastaram vários milhares de yen apenas para obter uma única personagem. Este evento levou à análise/ investigação pelos media de todos os jogos gacha, fazendo com que até mesmo os maiores jornais e canais de TV do Japão cobrissem o assunto. Devido à enorme reação negativa dos media e dos consumidores, Gran Blue Fantasy defendeu-se reembolsando todos os jogadores que gastaram elevadas quantias nesse evento e, posteriormente, começou a implementar sistemas que garantem que, a certo ponto, obtenhas com certeza o que desejas. Este sistema é chamado de “pity” e, após esse incidente, mais jogos começaram a implementar esses sistemas para proteger não apenas os seus jogadores, mas também as próprias empresas. Quando tu jogas um jogo gacha e usas a in-game currency do jogo para pular nos chamados “character banners”, tu podes verificar informações sobre as tuas chances de conseguir algo no banner e quanto vais precisar para garantir que receberás o que desejas. Isso não só ajuda a saberes quanto dinheiro precisarás para gastar se te deparares com o pior cenário possível (ou seja, se tiveres azar), mas também ajuda as empresas de videojogos a não serem processadas se não conseguires o que desejas.


Como é que este sistema de monetização é sustentável?


Como deves ter adivinhado, este tipo de monetização é muito arriscado. como é que convences jogadores a gastar dinheiro no teu jogo? A resposta fácil seria simplesmente criar um jogo bem feito, no qual as pessoas quisessem gastar o seu dinheiro, mas claro que não é assim tão simples. como os jogos gacha são todos live service, devem fornecer atualizações regulares de conteúdo, ou os jogadores deixarão de jogar. Conteúdos consistem em novas personagens, novas missões de história ou novos mapas para explorar. Essas atualizações são o que fazem as pessoas voltarem e jogarem o jogo, mas não é só isso. Esses jogos também implementam sistemas que incentivam as pessoas a voltar entre essas atualizações de conteúdo, e esses são chamados de “dailies” e “weeklies”. São missões pequenas que são reiniciadas ao dia ou semanalmente. Essas missões dão a tal in-game currency, um tipo de moeda exclusiva no jogo que o jogador pode usar para obter personagens através dos “character banners” que mencionei anteriormente.


O jogo pode ter gameplay muito bom, mas geralmente o que faz as pessoas gastar dinheiro são as suas personagens. Seja pela sua personalidade, aparência ou força, são as personagens que nos convencem à abrir os cordões à bolsa, Seja usando a in-game currency ganhada apenas por jogar ou gastando dinheiro real. É quase como um ciclo: o game developer dá ao jogador e incentiva o jogador a retribuir. Se o game developer não conseguir dar ao jogador o que ele quer, o jogo não terá lucros e será encerrado/descontinuado.


Com tudo isto em mente, vou falar sobre o game developer de videojogos mais bem-sucedido no espaço gacha e os seus jogos.


O SUCESSO DA Mihoyo


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Desde que não tenhas vivido isolado do resto do mundo ou estejas completamente desconetado da comunidade gaming, certamente já ouviste falar da MiHoYo (ou HoYoverse, como é conhecida mundialmente).


A MiHoYo é conhecida pelos seus jogos gacha de grande sucesso, em particular Genshin Impact, Honkai Star Rail e Zenless Zone Zero. Talvez também a conheças através de Honkai Impact 3rd, embora o HI3, apesar do seu sucesso, não tenha conquistado o público ocidental como os três jogos anteriores.


É óbvio que Genshin Impact foi o que tornou a MiHoYo mainstream. Acredita-se que o jogo se tornou popular porque era muito bem feito para a época, e que ganhou uma certa reputação por ser uma cópia de Legend of Zelda, o que não é de todo verdade. Para mim, a principal razão pela qual se tornou tão conhecido foi a decisão de lançá-lo em todas as plataformas, mas especialmente no PC. Os jogos gacha eram normalmente associados a jogos baratos, para telemóvel, que se podiam jogar todos os dias apenas para passar o tempo. Genshin Impact elevou o gameplay do jogo gacha ao status AAA. Tinha o orçamento de um jogo AAA e foi promovido como um jogo de topo.


O seu lançamento, em 2020 (em plena pandemia), foi um timing feliz. As pessoas estavam em casa e tinham de ocupar o tempo a fazer alguma coisa. Genshin Impact prestou-se a isso, porque tem uma jogabilidade viciante. Após o sucesso de Genshin, foram lançados mais dois jogos, Honkai Star Rail e Zenless Zone Zero, seguindo o mesmo formato, a única diferença é o tipo de gameplay, que mencionarei mais adiante.


Este é o formato que todos os jogos seguem:


A história e as missões do jogo são feitas para gostares das personagens, que podes obter através das “character banners” mencionadas antes, a menos que sejam oferecidas através de missões ou eventos especiais. Ao realizares missões, eventos e explorações, ganhas in-game currency, que é a moeda usada para qualquer banner disponível no jogo, seja “character banner” ou qualquer outra que possa melhorar ainda mais as personagens. Quando tiveres fortalecido as tuas personagens, seja através da obtenção de equipamentos ou do aumento dos seus níveis de habilidade, podes mergulhar em domains/stages/missions mais difíceis, onde lutas contra ondas de inimigos num limite de tempo. Este tipo de domain é referido pelos jogadores como “endgame content” e refere-se a desafios que as pessoas que jogam o jogo há bastante tempo se sentem confortáveis a jogar.


Agora vou falar sobre os três jogos mais em pormenor. como já os joguei há mais de um ano, posso dizer com confiança que tenho conhecimento suficiente para partilhar a minha opinião sobre eles.


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Genshin Impact acompanha Traveler e o seu companheiro Paimon por várias nações, em busca da irmã daquele, com quem traveler perdeu contacto devido ao encontro com um deus. O jogador assume o papel de Traveler enquanto este atravessa Teyvat. As nações deste vasto mundo são governadas por um Archon, a quem Traveler pergunta sobre o paradeiro da irmã. na maioria das vezes, antes de traveler entrar em contacto com os Archons, problemas de cada nação devem ser resolvidos.


O gameplay principal de Genshin Impact consiste em explorar o seu enorme mapa, resolver puzzles que surgem nas viagens, tornar as personagens adquiridas mais fortes, colecionar materiais encontrados e entrar em domains. O jogo apresenta um dos melhores sistemas de reação baseado em elementos das suas batalhas. Em vez de se comportar como Pokémon, onde os elementos se opõem uns aos outros, os 7 elementos de Genshin coexistem e reagem entre si. Isto incentiva ainda mais a obter uma diversidade de personagens, para que tenhas DPS de um certo elemento e, em seguida, supports de outro, etc.


O jogo acaba de celebrar 5 anos e a sua reputação é sólida. As histórias entretanto lançadas são sedutoras, as personagens divertidas de conhecer e Teyvat é lindo, com ambientes diversificados. Infelizmente, a minha maior reclamação surgiu pouco depois de ter começado a jogar: quase todas as personagens jogáveis têm um íntimo bom, mas eu preferia que os criadores não tivessem medo de criá-las mais imperfeitas/irremediáveis/moralmente ambíguas. Personagens como Scaramouche, Arlecchino e Raiden Shogun (antes da sua redenção) não são exemplos de virtude, mas são amadas por isso mesmo.


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Honkai: Star Rail acompanha Traiblazer a bordo do comboio Astral Express na exploração do espaço sideral em busca de aventuras e novas descobertas. jogamos na pele de Traiblazer e viajamos com a tripulação do astral express, para evitar desastres e alcançar harmonia cósmica.
O jogo explora o conceito universal conhecido como Path. Existem vários Paths e cada um está associado a um Aeon, que é na essência um deus. Cada Path abraça um ideal: Destruição, Beleza, Ordem, Abundância ou outros. As personagens de Star Rail que seguem esses Paths/ideais são conhecidas como Pathstriders. As que dedicam toda a sua vida a seguir um ideal são as Emanators.


O gameplay principal do jogo segue um RPG japonês de ações sucessivas, onde controlamos uma equipa de personagens para lutar contra inimigos/bosses. Os tipos de personagens estão alinhados com os Paths já referidos. Por exemplo, as personagens que seguem o Path da Destruição são os Damage dealers do jogo; as personagens que seguem o Path da Abundância os healers. A principal diferença entre este jogo e o ambiente de mundo aberto de Genshin é que Star Rail segue uma estrutura linear e uma exploração mais restrita.


Star Rail surgiu em 2023. mesmo não tendo tanto a oferecer como Genshin, a sua história é, na minha opinião, deveras superior, em particular o mundo de Penacony e a história ainda em desenvolvimento de Amphoreus. Embora a narrativa seja superior, por vezes falta conteúdo jogável. Há muito menos eventos limitados no Star Rail e, por isso, a sua jogabilidade pode tornar-se repetitiva. Outro aspeto menos conseguido é que há um aumento excessivo do poder das personagens. no Genshin, os jogadores apercebem-se que as personagens aumentam gradualmente de poder, enquanto que no Star Rail cada personagem que vai sendo criada possui um poder de base superior às anteriores, perturbando o equilíbrio do jogo e tornando quase impossível completar o “endgame content” sem a obtenção das personagens mais recentes.


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Zenless Zone Zero acompanha o duo Wise e Belle que se fazem passar por “Phaethon”, um Proxy Lendário que ajuda ilegalmente exploradores que atravessam Hollows controlando um robot parecido com um coelho chamado Eous. Hollows são desastres sobrenaturais em forma de esferas escuras que podem corromper objetos e pessoas que penetram neles. New Eridu é a última civilização que sobreviveu ao apocalipse causado por esses Hollows e consegue prosperar adquirindo bens e extraindo desses Hollows a corrupção que se designa por Ether. Se seres como flora e fauna forem capturados sem imunidade e não forem tratados transformar-se-ão em Ethereals. A industrialização e monetização dos Hollows aumenta gradualmente a tensão entre empresas monopolistas, gangues, conspiradores e fanáticos.


Tal como em Star Rail, o gameplay de ZZZ é muito diferente de Genshin. O jogo tem dois modos principais: o TV mode, que se comporta de forma semelhante a um roguelike, e o modo principal, que consiste numa batalha de alta ação tipo hack-and-slash, onde se podem trocar personagens numa equipa de três. Também é possível passear pelos locais de New Eridu, estilo Persona, interagindo com seres à nossa volta, ou então tomar um café e jogar minijogos num arcade próximo.


ZZZ foi publicado há pouco mais de um ano e teve um início atribulado. alguns consideraram o TV mode aborrecido (eu não!) e o seu combate hack-and-slash muito difícil para casual gamers. O jogo acabou por ter de ser alterado devido aos comentários negativos e parece estar agora numa melhor situação. Eu, infelizmente, deixei de jogar porque, ao contrário do que aconteceu com Genshin e Star Rail, que foram concebidos para hardware mais antigo, o ZZZ foi feito para PCs mais recentes e é-me difícil carregá-lo. O jogo é para ser apreciado pela sua beleza estética e é o mais bonito dos três que mencionei, com animações de primeira qualidade e cheias de vida, em parte devido à sua animação que usa squash and stretch (embora, às vezes, um bocadinho excessiva). A principal crítica que faço a ZZZ relaciona-se com a sua distribuição de personagens e respetiva raridade. Genshin Impact e Honkai Star Rail lançam com regularidade personagens femininas e masculinas com diferentes graus de raridade, mas ZZZ não. Quase todas as personagens de rank superior são raparigas, o que é estranho. Estou convencida que se o jogo tivesse mais variedade venderia (ainda) mais.


RECOMENDARIA ALGUM DESTES JOGOS?


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A resposta a esta pergunta depende do tipo de jogador. Se estás disposto a ter um jogo em que tens de fazer login (quase) todos os dias para maximizar o teu in-game currency, o que, por sua vez, te dá personagens divertidas de jogar/usar e acabas por gostar das histórias do jogo, vai em frente! Por norma, as pessoas escolhem qualquer jogo da MiHoYo porque acham as personagens atraentes e isso é um incentivo justo, embora pareça superficial jogar só em função da beleza das personagens. Todavia, quem sou eu para julgar!?!


Se és o tipo de pessoa que gosta de fazer parte de fandoms, vais-te encaixar perfeitamente num deles. As atualizações constantes com novas personagens e histórias certamente serão comentadas nas redes sociais e, como estes jogos são populares, há muitas fanarts, fanfictions, animações, edits, etc.


Existe também muito merchandise que podes colecionar, porventura até em excesso (estou a pensar na Comic Con e no Iberanime, yikes...). Imagino que a sua excessiva popularidade se torne isso mesmo: excessiva! Nas convenções dos últimos anos tem-se verificado uma saturação de artistas e bancas comerciais a vender artigos MiHoYo. Tudo o que é demais, enjoa!


AQUELES QUE SEGUIRAM OS PASSOS DA MIHOYO


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Desde o enorme sucesso de Genshin Impact que os jogos gacha se tornaram mainstream e amplamente aceites, não sendo vistos apenas como uma forma de ganhar dinheiro. Por esse motivo disso, muitos estúdios/empresas seguiram os passos da MiHoYo e lançaram jogos com o mesmo formato. São os chamados “Genshin Killers”, ou seja, jogos de ação em mundo aberto no estilo anime com sistemas gacha. Dois bons exemplos são: Tower of Fantasy e Wuthering Waves.


Tower of Fantasy foi lançado um ano após Genshin Impact e parecia que teria uma vida promissora, mas a sua história confusa depressa deitou tudo a perder. Surgiu, Aaém disso, uma grande controvérsia por se ter confirmado o roubo de assets de Honkai Impact 3rd. Além disso, o jogo não estava polido o suficiente para ser lançado. Desde então, Tower of Fantasy perdeu a maioria dos jogadores que conseguira engariar e os seus criadores dedicaram-se ao fanservice para se manterem à superfície.


Wuthering Waves foi lançado 4 anos depois de Genshin Impact e teve um início difícil. Surgiram notícias sobre problemas de otimização que causavam lag e baixo desempenho. Felizmente essas falhas foram corrigidas, tendo os seus criadores inclusive oferecido compensações in-game e feito melhorias significativas com atualizações. Os momentos de combate e os movimentos das personagens têm sido amplamente elogiados, assim como os gráficos. A popularidade do jogo tem crescido e Wuthering Waves tem tudo para se tornar num concorrente de peso no universo de jogos gacha.


Algumas OPINIÕES acerca de gacha...


"Gambling/Gacha não tem lugar nos videojogos. A sua existência não traz benefícios para o consumidor. Antes do Gacha ter tomado de assalto a indústria de videojogos era possível desbloquear recompensas (armas, skins, etc.) apenas jogando e evoluindo, ganhando EXP. O sucesso dos jogos tradicionais prova que não há necessidade de introduzir Gacha na indústria, especialmente quando ela já é atormentada por práticas predatórias como as Microtransações (MTX). O Gacha é apenas mais uma dessas práticas, A diferença está na sua subtileza! Ao incluirem MTX num jogo, os criadores denunciam a sua verdadeira intenção, que é de ganhar dinheiro. Os jogadores percebem essa intenção e, claro, criticam. Ao se depararem com Gacha num jogo, com a opção de gastar dinheiro real para garantir recompensas, os players estão mais interessados em garantir a sua dose diária de dopamina e não percebem que caíram na armadilha. Os videojogos não precisam de imitar os casinos! É verdade que Gacha ganhou popularidade, mas não podemos ignorar que os jogos sem gacha são ainda mais populares na indústria. Ressalva: Atenção que há jogos gacha e jogos ‘com Gacha’. Os primeiros, ao menos, são honestos; os últimos não.”


“Uma vez viciado num jogo gacha, o melhor é pensares duas vezes. Senão o fizeres vais ter um problema com gambling. Começarás a ajuizar a realidade à tua volta de acordo com a probabilidade de apostares ou não, mesmo que o mais certo seja perderes. O melhor é fugires!!”


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Parece que este tipo de jogo veio para ficar, embora os criadores devam compreender que o lançamento de um jogo gacha não é sinónimo de sucesso imediato. Estes jogos exigem dedicação por parte dos jogadores e, quando já estão embrenhados num gacha, é deveras improvável que o abandonem ou joguem outro em simultâneo, já que a sua natureza exige dedicação na forma de gameplay diário.

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